A instabilidade atraumática do quadril é uma potencial causa de dor, ainda pouco reconhecida, sendo definida como “movimento extra fisiológico do quadril que causa dor, com ou sem sintomas de instabilidade do quadril”.
Além da anatomia óssea coxofemoral, várias outras estruturas de tecidos moles também participam da estabilidade clínica e biomecânica do quadril em toda sua amplitude articular, tanto estática como dinamicamente. Essas estruturas são: a cápsula articular, a cartilagem articular, os ligamentos redondo e transverso, o lábio acetabular e a musculatura periarticular.
A instabilidade atraumática deve ser pesquisada em pacientes com hiperfrouxidão ligamentar, sendo que pacientes do sexo feminino que realizam atividades com grandes amplitudes de movimentos, como yoga e ballet, tem maior risco de desenvolver sintomas. O conceito de impacto secundário, que é o mecanismo de conflito patológico em pacientes com frouxidão ligamentar, morfologia normal e amplitude de movimento suprafisiológica, é bastante relevante em casos de instabilidade atraumática e nos indica que sempre devemos lembrar-nos do conceito patodinâmico do impacto femoroacetabular.
Dentre os fatores de risco mais comuns estão o sexo feminino, atletas que realizam movimentos suprafisiológicos, frouxidão ligamentar, pacientes com desordens do tecido conjuntivo (Síndrome de Marfan ou Síndrome de Ehlers-Danlos) e arquitetura óssea anormal (displasia do desenvolvimento do quadril). Algumas modalidades esportivas são biomecanicamente mais propensas a originar lesões no quadril secundárias à microtraumas, especialmente aquelas que combinam força com grande flexibilidade e amplitude de movimentos, como: ioga, golfe, tênis, ginástica olímpica e artística, capoeira, tae-kwon-do, ballet e corrida.
O diagnóstico de instabilidade é baseado na história clínica e exame físico. Os pacientes podem relatar dor anterior, estalidos, falseio, dor em posições de amplitudes extremas de movimento ou atividades esportivas. A mobilidade do quadril pode ser dolorosa nos extremos de amplitude de movimento, especialmente em hiperflexão e flexão associada à adução e rotação interna. O paciente pode referir apreensão e/ou dor à manobra de extensão-abdução-rotação externa. Sinais de hiperfrouxidão ligamentar devem ser avaliados no exame clínico.
O tratamento dos pacientes sintomáticos deve ser inicialmente conservador. Fortalecimento e estabilização articular podem aliviar os sintomas. Analgésicos e anti-inflamatórios podem ser utilizados conforme a necessidade. A modificação das atividades, especialmente as que envolvem extremas amplitudes de movimento, também pode gerar alívio dos sintomas.
No caso de insucesso com o tratamento clínico, o tratamento cirúrgico pode ser indicado e consiste na abordagem de deformidades anatômicas, do impacto femoroacetabular e lesões labiais. A plicatura capsular, aberta ou artroscópica, pode ser utilizada em casos de hiperfrouxidão ligamentar.
Referências bibliográficas
1. Shindle MK, Ranawat AS, Kelly BT. Diagnosis and management of traumatic and atraumatic hip instability in the athletic patient. Clin Sports Med. 2006 Apr;25(2):309-26, ix-x.
2. Domb BG, Philippon MJ, Giordano BD. Arthroscopic capsulotomy, capsular repair, and capsular plication of the hip: relation to atraumatic instability. Arthroscopy. 2013 Jan;29(1):162-73.
3. Philippon MJ SM. Athletic Hip Injuries and Capsular Laxity. Oper Tech Orthop. 2005;15:261-6.
4. Kalisvaart MM SM. Microinstability of the hip—it does exist: etiology, diagnosis and treatment. Journal of Hip Preservation Surgery. 2015;2(2):123-35.
5. Nepple JJ, Smith MV. Biomechanics of the Hip Capsule and Capsule Management Strategies in Hip Arthroscopy. Sports Med Arthrosc. 2015 Dec;23(4):164-
Marcelo Queiroz
Mestre pela Faculdade de Ciências Médicas da Santa Casa de São Paulo. Membro do Grupo do Quadril do Departamento de Ortopedia e Traumatologia da Irmandade da Santa Casa de São Paulo. Membro titular da SBOT e da Sociedade Brasileira de Quadril.